Pedagoga, psicopedagoga, especialista em supervisão escolar e processos de desenvolvimento e mudança social, mestre em educação e doutoranda em ciências pela UERJ, hoje, Deborah Baesse é professora do Departamento de Educação I da Universidade Federal do Maranhão.
Uma das Fundadoras do Centro Educacional Colméia, referência em educação infantil e fundamental na década de 80/90, Deborah começou cedo sua carreira, dando aulas de dança com Reynaldo Faray e atuando como professora no Colégio Santa Teresa.
Fez parte do corpo docente do então CEFET, atual IFMA e já foi professora, coordenadora e diretora pedagógica em escolas privadas e públicas da rede estadual e municipal de educação.
Mas se engana quem pensa que ela tem expressividade apenas na Educação local. Deborah participou da fundação do Instituto de Cidadania Empresarial do Maranhão – ICE, fomentando a ideia de responsabilidade social empresarial. Também já foi membro da Comissão do Prêmio Itaú Unicef por vários anos e participou da Mostra Brasil 500 anos, onde coordenou a Ação Educativa.
Além, é claro, como ela mesma diz, de sempre se reinventar “na luta diária como mãe, esposa, filha, irmã, amiga, mulher e tantos outros papeis que temos que desempenhar nessa aventura deliciosa que é viver”.
SoT: Estamos em 2015 e começamos a ver algumas mudanças no cenário político da cidade. Mas ainda existem muitas questões políticas, sociais e culturais que permanecem inalteradas. Como você vê a cidade de São Luís? O que te agrada e o que te incomoda?
Deborah: São Luís é a cidade que eu amo. Aprendi com meus pais Zelinda e Carlos Lima a amar esse lugar independente de suas dificuldades. Não existe lugar perfeito. As cidades são construções coletivas e cada um de nós tem que se sentir artífice do lugar onde mora. Depois que meu pai morreu, relendo suas obras para matar a saudade imensa que sinto dele, observei que tudo que ele escreveu tem São Luís (e o Maranhão) como cenário e como tema. Eu fico muito feliz de ver que um novo grupo, mais jovem e capaz está assumindo as rédeas da cidade e do estado em busca de implantar mudanças. Vejo amigos do movimento estudantil da UFMA e UEMA e companheiros de muitas jornadas e sonhos protagonizando um novo momento. Entretanto, tenho clareza de que ainda assim levaremos muito tempo para mudar o que mais me incomoda: a injustiça social. Esse problema é estruturante, foi sedimentado por décadas. É preciso trabalhar duro e certo para reconstruir tanta coisa que está no caminho errado nesse nosso planeta.
O maravilhoso Gandhi disse que precisamos SER a mudança que queremos ver no mundo. Acho fantástica essa frase. É isso: você precisa praticar o que fala.
SoT: E o que tu achas que poderia ser descartado ou adaptado?
Deborah: Apesar da dificuldade de implantar mudanças estruturantes que são por natureza processuais e demoradas, há sim muito o que fazer. Penso que a saída é ter um plano claro de intervenções na cidade, contemplando ações de curto, médio e longo prazo. Há muitas “pequenas” mudanças que podem gerar grandes impactos. A primeira delas é o envolvimento das pessoas nas soluções dos problemas, o investimento e valorização do centro histórico, nosso maior patrimônio, um investimento sério e consistente em educação, que garanta às crianças e jovens escola de qualidade em tempo integral, apoio ao esporte, a cultura e a arte. Investimento em transporte público, limpeza urbana e ocupação qualificada dos espaços de convivência comunitária. É preciso ainda integrar a “velha” São Luís com essa São Luis modernosa que surgiu do lado de cá da ponte.
Outro aspecto que muito me incomoda é uma certa classe emergente que surgiu na cidade e que não tem nenhuma sensibilidade para questões humanas, sociais e culturais. Via de regra tem muito dinheiro e pouca educação. Andam em carrões de luxo e jogam lixo pela janela, sobem nos canteiros, param em vagas reservadas a pessoas com deficiência e comportam-se no trânsito como se estivessem em uma guerra. É preciso investir muito em educação e isso não tem nada a ver com poder aquisitivo. Tenho muito amigos que vivem na periferia e são infinitamente mais educados que alguns moradores das áreas nobres da cidade.
SoT: E o que você acha que poderia receber mais investimento?
Deborah: Como já disse em primeiro lugar educação. E não é apenas educação escolar. Falo de educação em sentido amplo: educação ambiental, artística, formação de plateia, educação financeira, esportiva, patrimonial, espiritual…
Tenho a sensação de que estamos em um processo de desumanização. O individualismo exacerbado, o preconceito crescente e o esvaziamento dos espaços de convivência comunitária é algo que me assusta.
SoT: Mas para que toda essa mudança ocorra, precisamos que as pessoas comecem a atuar como agentes de mudança. O que você acha que deveria mudar no comportamento das pessoas, para que essas transformações ocorressem?
Deborah: O maravilhoso Gandhi disse que precisamos SER a mudança que queremos ver no mundo. Acho fantástica essa frase. É isso: você precisa praticar o que fala. Todo mundo quer um trânsito fluido, mas ninguém quer abrir mão da comodidade do seu carrão. É verdade que o transporte público não ajuda, mas o caminho mais cômodo é o individual. As pessoas reclamam da corrupção, do nepotismo e tantas mazelas, mas na hora de arranjar um bico para o seu parente, de tirar uma vantagem em algo errado, tá valendo. É como se as leis fossem só para os outros. A Empatia e a coerência são virtudes a serem perseguidas por todos nós!
SoT: Quais os ganhos você espera que a cidade tenha com essas mudanças de comportamento?
Deborah: Ganhos de civilidade. Esses são os mais importantes. Antes do asfalto, da estrada, da obra de tijolo e barro é preciso reformar as pessoas e isso envolve todos nós. É preciso distribuir renda, reduzir a desigualdade e valorizar o ser humano. Uma São Luis mais justa, humana e civilizada vai gerar um povo mais feliz e isso é o que de fato importa.
SoT: Como você age no dia-a-dia de forma que essas ideias sejam expostas?
Deborah: Eu procuro em primeiro lugar praticar a coerência e a empatia. Sempre me colocar no lugar dos outros. Procuro praticar a máxima de Gandhi e isso não é nada fácil. Claro que estou longe de chegar lá. Mas o exercício diário de autoconhecimento e mudança pessoal é que nos resta.
Outra questão é fazer bem feito o que você se propõe. Em meu oficio de professora universitária busco exercer minha profissão com a maior seriedade e compromisso possíveis. Graças a Deus posso dormir tranquila porque sei que meus alunos são testemunhas vivas do meu esforço para cumprir com dignidade e compromisso meu trabalho. Tenho sérias críticas a política educacional implantada atualmente nas universidades públicas brasileiras. Na pratica o que menos conta atualmente na avaliação de um professor universitário é seu trabalho em sala de aula. Apesar do discurso do equilíbrio entre pesquisa, ensino e extensão, somos avaliados pelos títulos acadêmicos e pelos artigos que publicamos. O seu desempenho como professor e a opinião que os alunos tem da importância do seu trabalho no desenvolvimento e formação profissional deles acabam contando muito pouco ou quase nada. Faço de questão de pedir aos meus alunos que me avaliem, que apontem aspectos a melhorar.
SoT: Existe algum projeto que você realiza hoje, ou gostaria de realizar?
Deborah: Há muitas ideias e possibilidades. Dentre elas destaco o sonho de fundar um espaço onde possa expor todos os livros, objetos e obras de arte que meus pais reuniram a vida toda. Gostaria de disponibilizar esse acervo riquíssimo para todas as pessoas da cidade, dando um fim social ao mesmo.
As cidades são construções coletivas e cada um de nós tem que se sentir artífice do lugar onde mora.
SoT: Existe algum projeto que você gostaria de ajudar a divulgar e que teria um forte impacto, caso recebesse o investimento ideal?
Deborah: Existem alguns…rsrsrsrs
O Estaleiro Escola, por exemplo, “tocado” a duras penas pelo grande Luiz Phelipe Andrés que visa manter a ciência e a arte das embarcações tradicionais do Maranhão e que felizmente voltou recentemente a contar com o apoio do Governo do Estado;
O BR 135, um super projeto de promoção e divulgação de novos talentos da cena musical local idealizado pelos talentosos Luciana e Alê Muniz;
O Observatório Social e o Movimento Nossa São Luis, responsáveis pelo levantamento e monitoramento de indicadores de qualidade de vida da cidade, sob a coordenação do Daniel Madorra;
A Associação dos Moradores da Área Itaqui Bacanga – ACIB, o Ecomuseu Sitio do Físico, o Coral Canto Curumim, o Fórum de Desenvolvimento Sustentável do Jaracati, o Circo Escola da SEMCAS, o Projeto Cidade Jardim do IMPUR e tantas outras belas iniciativas públicas e privadas que estão ai pela cidade como faíscas a iluminar e aquecer nossa esperança. Tem muita coisa legal acontecendo e tem muita gente boa querendo contribuir. A mudança nasce do encontro desses dois pólos.
5 Comentários
Jonas & Cia. Cara, bem legal a entrevista! Cara, minha filha estudou no último ano do Colméia, no ano passado. Ficamos arrasados: eu e Poliana porque era uma escola com um modelo pedagógico muito bonito e encantador. Foi uma pena o fim. :/ Gosto muito de saber de pessoas que torcem e buscam ajudar no crescimento e desenvolvimento – principalmente – em seu aspecto humano. Precisamos tão muito de amor, felicidade e paz. Não lembro qual foi a última vez que vi alguém feliz nas ruas. São tão raros nossos sorrisos para as outras pessoas. Parece que só gostamos de rir para câmeras, né? Mas vamos lá – tentar fazer o oposto, tentar ajudar a viver de outra forma e ajudar os outros a viverem assim. Um abraço. Sucesso, galera!
André, muito obrigada por acompanhar o nosso trabalho.
Uma das nossas intenções do blog, e principalmente do Projeto “A cara da cidade”, é justamente mostrar não só essa felicidade das pessoas aqui em São Luís. De mostrar que existem trabalhos que permitem valorizar o ser humano em sua essência mais bonita.
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Parabéns pela entrevista, mas parabéns maior pelo site. Algo novo no ar.
Muito obrigada Jefferson. Tanto o projeto como o próprio blog tem um objetivo muito massa de mostrar um pouco de São Luís e do Maranhão para os seus próprios filhos e para o resto do Brasil.
Espero que você continue acompanhando nossas jornada.
Abraços