Recentemente me peguei bem chateado por não estar achando o material para fazer minha aula de capoeira. A chateação estava bem ligada à “sacanagem” que estava acontecendo, pois deixei em um lugar onde não estava mais, e ainda era bem raro conseguir ir a capoeira com regularidade, o resultado foi que fiquei bem puto da vida.
A caminho e durante aula, comecei a lembrar a quantidade de coisas, que possuía e não usava mais. Coisas que deveriam estar espalhadas e sempre estavam mais ou menos no lugar. Então, depois de todo o “mimimi” de chateação ter passado em mim, comecei a perceber que boa parte da minha vida estava de alguma maneira organizada, contudo não era eu que organizava. A partir daí uma pergunta surgiu: Como assim?
É que sempre me orgulhei de fazer muitas atividades, de ser muito criativo e em algumas ocasiões usei muito do discurso do “ócio criativo”. Mas, assim como na Grécia Antiga, alguém tinha que dar conta do que deveria ser meu trabalho para que eu estivesse “livre” para lhe dar com atividades menos braçais. Nesse momento toda a chateação que descrevi no começo do nosso papo perdeu todo o sentido.
Cada coisa que defino por minha começou a parecer que deveria ser minha responsabilidade. E quando eu tenho tanta coisa que não uso e/ou que só foram necessárias durante um curto período de tempo, acabo por jogar nas costas de outra pessoa um fardo que deveria ser meu, com a desculpa “de precisar de uma liberdade” que acaba por privar a liberdade do outro. A partir daí vejo que além de não parecer algo muito legal com as pessoas que me cercam, esse consumo desnecessário de coisas que não uso e que não dou conta não parece ser algo muito inteligente.
Tendo um pensamento bem matemático: posso dizer que o excesso de coisas que consumo, e hoje percebo que é quase tudo, me gera uma responsabilidade com a posse, essa responsabilidade me priva da liberdade que necessito para exercer atividades que apaziguam minha alma. Com isso posso dizer que o consumo em excesso me deixa mais atarefado e com menos recursos para coisas mais significativas, ou seja, sem tempo e dinheiro. Percebeu?
No fim das contas, quando procurei de verdade, meu material de capoeira apareceu. Comecei a me responsabilizar pelas minhas coisas e parei de minar a liberdade dos coleguinhas.
Pode parecer bobagem, mas me peguei pensando sobre as dívidas que temos com a minha ou a sua liberdade. Daí te pergunto: Quem paga pela sua liberdade?
1 comentário
Sabe, João…
Eu sempre tive a sensação de que a casa onde ainda hoje vivo, não é minha.
Desde os 3 anos eu morei com minha mãe e minha vó. E por conta da convivência por vezes conturbada, eu vivia dizendo que não via a hora de poder seguir minha vida e deixar outra pessoa tomando conta delas.
Mas eu não tinha como sair e nem tinha com quem deixá-las. Então a convivência seguiu, alguns combates se mantiveram, e então, neste ano, no mês de agosto, eu perdi minha vó. Cerca de 45 dias depois, minha mãe também faleceu. E hoje que estou sozinho na casa e com toda a liberdade do mundo para ir para qualquer canto, sinto a minha alma pedindo a Deus apenas a oportunidade de ter mais um dia com elas, mesmo que fosse pra discutir como normalmente era feito. Mesmo que fosse pra reclamar das teimosias ou do gênio difícil de lidar por conta da idade. Mesmo que fosse para passar reto sem dizer uma única palavra, mas sabendo que elas estavam ali.
Dai você me vem e pergunta quem paga essa conta. E aqui estou com a sensação de que a dívida é minha. Não há dúvidas. Mas eu trocaria essa liberdade que – finalmente – hoje eu tenho, pela chance de cuidar delas por mais um tempo. Independente do quanto.